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segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Amor de Perdição

Em Amor de Perdição encontramos o traço principal da novelística passional de Camilo: a conceção do amor como uma espécie de destino, de fatalidade, que domina e orienta e define a vida (e a morte) das personagens principais.

Marcado pela transcendência, esse amor trará consigo sempre um equivalente de sofrimento e de infelicidade: ou porque a paixão choca frontalmente com as necessidades do mundo social, ou porque significa, em última análise um desejo de recuperar o paraíso na terra.

As personagens desfilam como “mártires do amor” que, no sofrimento, encontram a razão de ser e o sentido mais profundo da sua vida.

A obra acabou por se tornar uma espécie de Romeu e Julieta lusitano. Tem o traço shakespeareano onde as nobres famílias Botelho e Albuquerque vêem o ódio mútuo ameaçado pelo amor entre Simão Botelho e Teresa Albuquerque.
Simão - o herói romântico, cujos erros passados são redimidos pelo amor .
Teresa - a heroína firme e resoluta no seu sentimento de devoção ao amado. 
 Mariana -, a mais romântica das personagens, tendo em vista a abnegação.
Todos representam a dimensão amorosa, o sentimento da paixão, ao qual se opõe o mundo exterior, a sociedade com sua hipocrisia.

A apresentação de Simão Botelho pelo narrador é essencialmente romântica: é feita de um modo a parecer real, verdadeira, e não ficcional. Os escritores românticos serviam-se de recursos como este presente em Amor de Perdição para que suas obras tivessem maior credibilidade, conquistassem a confiança do leitor.

Os elementos realistas de Amor de Perdição estão na crítica às instituições religiosas, os conventos, e no comportamento não-passional de alguns personagens secundários, como João da Cruz, É possível perceber estes elementos nas passagens da obra em que o narrador denuncia a corrupção do convento de Viveu e enfatiza a lealdade, o senso prático, a sensatez de João da Cruz, relativizando assim a passionalidade predominante no romance.

Esta obra caracteriza-se por um narrador omnisciente, isto é, um narrador que desvenda o universo interior dos personagens, sabendo mais do que eles próprios, o que lhes passa pela mente e pelo coração, na medida em que ele não só revela mas também comenta os sentimentos e comportamentos dos personagens, deixando claro o seu ponto de vista a favor dos que amam e contra os que impedem a realização do amor.

A estrutura de Amor de Perdição é resumida pelo narrador na introdução da obra da seguinte forma: “amou, perdeu-se e morreu amando”.

Introdução “amou” -Apresentação global do infortúnio de Simão Botelho – o degredo.

Desenvolvimento “perdeu-se”- • Amor de Simão e Teresa – correspondido, mas proibido. • Amor de Mariana por Simão – não correspondido. • Assassínio de Baltazar Coutinho. • Condenação de Simão ao degredo. • Ida de Teresa para o Convento. • Morte de Teresa.

Conclusão “morreu amando”  • Morte de Simão. • Suicídio de Mariana.


Simão Botelho-  A princípio mostra-se como um rebelde de temperamento incontrolável e cruel. Um grande perturbador e agitador da ordem pública e uma fonte interminável de desgostos para os seus pais. Modifica o seu comportamento de forma brusca quando começa a nutrir sentimentos pela jovem vizinha Tereza de Albuquerque. O amor  transforma-o, redime-o, modifica-o, apresentando Simão a partir de então um caráter cheio de virtudes e um sentimento realmente puro e verdadeiro. Torna-se honesto, estudioso e responsável, pois deseja obter condições de sustento para viver com a amada. O único sentimento que Simão não perde apesar de toda a transformação é o sentimento de vingança que culmina com o assassinato de Baltazar Coutinho, primo de Tereza. A passionalidade de Simão também é recuperada a partir deste episódio na medida e que ele foge das tentativas de absolvição deste crime declarando-se sempre como culpado e demonstrando-se firme e obstinado. Simão é o estereótipo do típico herói romântico, pois é rebelde, insatisfeito, anseia por um amor absoluto que só poderá atingir depois da morte. 
O herói romântico vive em conflito com a sociedade opressora, de modo que a sua atitude oscila entre um ser ora marginalizado, desregrado, ora dotado de virtudes, justamente como forma de rebelar-se contra tal realidade.

Tereza de Albuquerque é a protagonista feminina. Uma jovem de apenas quinzes anos que se apaixona de forma proibida pelo vizinho Simão Botelho. Tereza, aparentemente frágil, assim como o amado, sustenta uma personalidade de caráter firme e resoluto que enfrenta tudo e todos pelo seu sentimento. Atua de forma inflexível perante as sucessivas ameaças do seu pai, um homem cruel e autoritário. Ela não age diretamente como Simão (devido principalmente a condição subjugada a mulher de sua época), porém demonstra a mesma obstinação do amado, preferindo até mesmo o martírio, o enclausuramento e até a perda a vida do que ceder a vontade de um casamento forçado pelo seu pai. Age guiada somente pelo amor. Por estas e outras características, Tereza assume a posição de heroína romântica.

 Mariana é a terceira peça principal desta história formando o  triângulo amoroso mesmo que de forma não correspondida e indireta. É uma moça humilde, abnegada e triste, sendo considerada como a personagem mais romântica. Cuida de Simão com extremo devotamento quando este mais necessita, passando a nutrir um amor puro, mas sem esperanças, que tudo suporta e tudo perdoa até mesmo a paixão deste por Tereza. O seu amor é sublimado, dedicado, fazendo esta de tudo para ajudar o amado, tornando-se até mesmo cúmplice da sua paixão proibida, nunca rivalizando com Tereza. Quando Simão é preso, Mariana abandona o pai e passa a viver na sua companhia na prisão. A sua entrega culmina com seu suicídio quando se lança ao mar ao ver o corpo de Simão ser lançado. Ela é a própria personificação do espírito de sacrifício.