Cesário Verde disse
um dia, em carta enviada ao seu amigo Silva Pinto :
“A mim o que
me rodeia é o que me preocupa.”
Duma fase romântica, em que se manifesta um gosto
acentuado pela paisagem campestre, o poeta evolui no sentido do social, da
procura da justiça e da solidariedade, deambulando pelas ruas de Lisboa e
sofrendo com os dramas da sua gente simples e humilde.
Identificando a visão plástica, de aguarelista, com a
visão do poeta, fiel, por outro lado, à estética do positivo e do sincero,
Cesário superou o naturalismo, isto é, a pretensão da estrita objetividade. O
estilo de Cesário traduz, por vezes, uma atitude impressionista, em que
avulta uma sensação inicial, só depois referida ao objeto(“amareladamente,
os cães parecem lobos”), ou então se combinam sensações e se misturam o
físico e o moral (“Ombros em pé,
medrosa e fina...”).
A obra de Cesário Verde, pelas múltiplas influências que
nela se cruzam, é o ponto de encontro de várias correntes que eram ou haviam de
ser importantes na cultura portuguesa:
_ Realismo _Parnasianismo
_Impressionismo _Simbolismo
_Surrealismo _Neo-realismo
Oposição Cidade/Campo
O
tempo-espaço inicialmente definido nos poemas de Cesário é a cidade, a
realidade presente que, ao ser contrastada com a metáfora antinómica
representada pelo campo, é definida como confinadora e destrutiva.
Ao
nível pessoal a cidade representa a ausência, a impossibilidade ou a
perversão do amor.
Ao
nível social, a cidade significa opressão, fechamento, doença e morte; o
campo a possibilidade do exercício da liberdade,
saúde e vida.
A IMAGÉTICA FEMININA
Cesário ama a distanciação, o afastamento. Assim ela
passa, vagueia, é entrevista no luxo de uma carruagem veloz. Isso permite-lhe
avaliá-la na plástica dos seus sentimentos, na imponência que pode seduzi-lo,
no luxo de sedas e veludos que a distinguem, na soberbia do carro que a
transporta.
O poeta depara com dois tipos de mulher que estão
articulados com os dois locais em que se movimentam. Assim, tal como a cidade
se associa à fatalidade, à morte, à destruição, à falsidade, também a mulher
citadina é apresentada como frívola, calculista, dominadora, destrutiva, sem
sentimentos. O erotismo da mulher fatal é humilhante, conseguindo reduzir o
amante à situação de presa fácil.
Em contraste
com esta mulher predadora, surge um tipo feminino que é o oposto. É frágil,
terna, ingénua, despretensiosa, mesmo que enquadrada na cidade. Desperta no
poeta o sentimento de protecção, mas não o de se prostrar aos seus pés.
Há pois dois
tipos de mulher na poesia de Cesário: mulher fatal / mulher angélica,
associadas à morte e à vida, à cidade e ao campo, respetivamente.